Andreia Donadon Leal
MARIANA MG [ ABN ] — 29 de outubro é Dia do Livro, o maior patrimônio cultural de todos os tempos. Livro nos dá asas, olhos, sensações, conforto, desconforto, informações e alteridade. Dom João VI sabia da importância do livro para a ampliação do repertório linguístico, cultural, educacional e afetivo da gente daqui.
Quem lê tem coisas para falar, pensar, argumentar, defender-se das intempéries e injustiças da vida. Quem lê, ama com todas as potências do amor.
Guardo livros nas prateleiras de casa. Eles são patrimônios da minha humanidade. Limpo cada obra como se estivesse dialogando com os autores, editores e personagens dos livros. Eles me revelam temperamentos diversos, às vezes chocam com suas rebeldias, ou simplesmente, dão exemplos e respostas para nossas idiossincrasias.
Confesso: sou uma pessoa idiossincrática! Por muitas vezes, fora dos que todos esperariam.
Poeta é assim, meio fora da regra, fora do meio-fio, fora do prumo ou fora de tudo o que é reto e circular.
A chuva nasce com o amanhecer, seduzindo o dia e a noite com suas gotas em forma de gargantilhas ou caudalosas. Aguardei o dia acordar meu ânimo formiga. Minhas manhãs são sempre pálidas e molhadas, mesmo em tempos de estiagem. Se não fossem o barulho do relógio e da água da chuva acariciando o quintal, eu continuaria pedra.
Abri um livro de aforismos. Li o pensamento do dia; “nem tudo são frutos e luzes.” Arrematei: tudo pode ser frutos e luzes, se a arte da palavra florescer. Envelhecer, amadurecer.
Um poeta declamou o poema, senectude. Tenho sentido alguns efeitos da senescência. Cabelos brancos e ralos. Memória enfraquecida. Pele flácida e enrugada. Quem disse que envelhecer é mágico, não creio que se lembrou das dores nas juntas, da visão se embaçar, dos passos mais lentos, às vezes, titubeantes. Sim, envelhecer é coisa preciosa! Quem disse que não é? Eu não disse, nem escrevi que não é. Mas é, prezados leitores, uma fase de perda de pelos, de ganho de peso, de gastos generosos com a saúde. Os hormônios em processo de regressão; os hormônios sintéticos entram no lugar, com seus efeitos colaterais ou não.
Vi mãe e pai envelhecerem sem grandes alardes e queixumes. Pai nunca se queixou de nada, mas sofria, eu sei. Seu olhar, às vezes, trazia uma nesga de tristeza. Eu senti. Senti suas mãos tremerem, seu sorriso forçado, seu olhar longínquo… Mãe reclamava das dores, mas driblava os sintomas da senescência.
Tento driblar lendo mais livros. As letras hidratam meus neurônios, ativam serotonina. Olho o livro na prateleira, estão todos enfileirados e limpos. Alguns com folhas amassadas. Li estes livros mais de três vezes. Minha casa é uma biblioteca em movimento. Entra livro, sai livro… Brota e rebrota num efeito mágico de Deus. Milagre mesmo de quem doa, sempre recebe.
E penso na biblioteca desta cidade, nos queixumes do guardião dos livros. E me pego a querer chorar, também. E claro, choro. Quem não chora pelo abandono de uma biblioteca? Quem não se curva à preservação do maior patrimônio da humanidade? Talvez, quem não sabe que a essência da vida está lá, bem lá, ao alcance de todos.
Meus pais diziam que quem lê livros nunca está só, nunca deixa de sonhar, nunca deixa de se aventurar, nunca deixa de saber dos acontecimentos históricos da humanidade, e se transforma num ser humano melhor…
Tudo pode ser luzes e frutos se a vontade do outro souber florescer!